
1. TRABALHEI EXPOSTO À POEIRA DE ALGODÃO. ESSA SUBSTÂNCIA PODE SER CONSIDERADA COMO AGENTE NOCIVO PARA FINS DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL?
Não é incomum que os trabalhadores das indústrias têxteis trabalhem expostos à poeira de algodão, além dos limites de tolerância permitidos. Vejamos neste artigo se essa substância pode ser considerada como agente nocivo para fins de reconhecimento de períodos especiais para a concessão de aposentadoria.
Estudos demonstram que os obreiros da indústria têxtil, principalmente quem trabalha como tecelão, exercem as suas atividades expostas à poeira de algodão acima dos limites de tolerância permitidos. Essa exposição está diretamente relacionada ao aumento de doenças respiratórias ocupacionais. Os principais sintomas consistem em tosse com expectoração crônicas e dispneia aos esforços, por exemplo.
Apesar da presença dessa substância prejudicial no ambiente de trabalho, atualmente não há previsão legal que a enquadre como agente nocivo para fins de enquadramento de tempo especial. Entretanto, o trabalhador pode comprovar que laborou exposto a esse agente nocivo por meio de algumas provas, como o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP e o Laudo Técnico das Condições do Ambiente de Trabalho – LTCAT, por exemplo.
Quando o empregado realiza as suas atividades em condições prejudiciais à sua saúde, estes documentos devem ser fornecidos obrigatoriamente pelo empregador, conforme preconiza o art. 8, § 4º, da Lei 8.213/91 e art. 68, § 6º, do Decreto 3.048/99. A empresa fica sujeita à aplicação de multa, quando não mantém o laudo técnico atualizado com referência aos agentes existentes no ambiente de trabalho prejudiciais à saúde de seus trabalhadores ou quando emite documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o referido laudo (art. 68, § 6º, do Decreto 3.048/99).
Uma vez com a documentação probatória em mãos, o segurado deverá apresentá-la no momento do requerimento administrativo. Provavelmente, o pedido para o reconhecimento do período especial será indeferido no âmbito do INSS, em razão da inexistência de previsão legal que enquadre a poeira de algodão como agente nocivo para fins de reconhecimento de tempo especial. Desse modo, será necessário recorrer à via judicial. O advogado previdenciário poderá alegar a aplicação da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos – TRF, que reconhece o direito à concessão da aposentadoria especial, caso seja constatada que a atividade exercida pelo segurado é prejudicial à sua saúde, ainda que esta não esteja relacionada na legislação:
Seguridade social. Aposentadoria especial. Atividade insalubre, perigosa ou penosa. Constatação por perícia judicial.
Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento.
No caso, o trabalho com exposição permanente à poeira de algodão, acima dos limites de tolerância permitidos, pode ser enquadrado como atividade insalubre. Esse fato pode ser comprovado, inclusive, por meio de perícia judicial no local de trabalho do segurado.
Além disso, há que se destacar o entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, que afirma que são meramente exemplificativas as normas regulamentadoras que estabelecem as categorias de atividades e tipos de agentes nocivos prejudiciais à saúde.
Vejamos a tese firmada por meio do Tema nº 534 (REsp 1.306.113/SC), julgado sob o rito dos recursos repetitivos:
As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).
Quando há uma tese firmada por meio do rito repetitivo, os juízes e tribunais devem observar obrigatoriamente esse entendimento firmado ao julgar um caso semelhante.
Pelo teor da tese firmada pelo Tema nº 534, caso seja constatado que o agente nocivo é prejudicial à saúde do trabalhador na literatura médica, bem como em legislações correlatas, essa substância poderá ensejar o reconhecimento da especialidade do período laborado. Além disso, é importante que seja demonstrada a ausência de disponibilização de Equipamento de Proteção Individual – EPI ao empregado e, se for o caso, que o equipamento era ineficaz para a plena proteção do segurado durante o exercício das suas atividades.
Vale relembrar que apenas a partir da publicação da Lei n. 9.732, de 11/12/1998, o INSS passou a investigar acerca do uso de equipamentos de proteção individual. Sendo assim, o entendimento dos tribunais sobre o tema é no sentido de que o caráter especial da atividade não pode ser afastado em razão da indicação de EPI eficaz para o período anterior à publicação da Lei n. 9.732, em respeito ao princípio do tempo rege o ato. Ou seja, não pode ser aplicada uma norma para um período anterior, no qual ela ainda não estava em vigor.
Tendo em vista essas considerações, vejamos uma decisão que reconhece o reconhecimento do tempo como especial em razão da exposição à poeira de algodão:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO E POEIRA DE ALGODÃO. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. LAUDO POR SIMILARIDADE. [...] 4. A exposição à "poeira de algodão" dos trabalhadores em indústria têxtil enseja o reconhecimento do tempo como especial. Com efeito, não há óbice à possibilidade de reconhecimento da "poeira de algodão" como agente agressivo para fins previdenciários, ainda que não haja referência expressa a esse agente nos Anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999, uma vez que a jurisprudência, inclusive do STJ firmada em julgamento de controvérsia repetitiva (REsp 1.306.113/SC, Tema STJ 534), é firme no sentido de que as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas. Assim, é devido o reconhecimento e cômputo, como especial, de tempo de serviço se perícia ou laudo técnico efetivamente comprovam que a atividade exercida pelo segurado é nociva à saúde e integridade física do trabalhador, como no caso concreto, principalmente porque, na hipótese, não havia utilização de equipamentos de proteção individual. [...]
(TRF-4 - AC: 50120325720164047205 SC 5012032-57.2016.4.04.7205, Relator: CELSO KIPPER, Data de Julgamento: 23/11/2021, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC)
O pedido para o reconhecimento do período como tempo especial pode ser feito tanto para quem ainda não se aposentou ou para aqueles que já são aposentados, desde que a aposentadoria não tenha sido concedida há mais de 10 anos.
Caro leitor, caso você tenha trabalhado na indústria têxtil e acredita que exerceu as suas atividades expostas à poeira de algodão, procure um advogado previdenciário para que ele analise a sua situação.
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Por: Jéssica Jorge Ramalho - Advogada